20 de maio de 2017

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João Oliveira em entrevista no DN, faz o "ponto da situação"

João Oliveira, líder parlamentar do partido, diz que "há condições para avançar" em várias propostas.
Aumento das pensões, mais investimento e novas contratações na educação e na saúde, aumento dos impostos sobre os lucros das empresas, fim dos cortes no subsídio de desemprego - estes são alguns dos temas que o PCP vai levar para a mesa das negociações com o governo ao longo dos próximos meses.
A direção do PCP reuniu esta semana com António Costa para começar a preparar o orçamento...
A reunião não foi sobre o Orçamento de 2018 - colocámos um conjunto de matérias que ultrapassa em muito o orçamento. O que levámos à reunião foi uma apreciação global sobre a situação do país, medidas que foram tomadas, problemas que persistem, medidas que precisam de ter desenvolvimento e outras que precisam de ser tomadas - a precariedade, as questões relacionadas com a contratação coletiva, com as longas carreiras contributivas, política fiscal, eliminação de cortes que se mantém, o salário mínimo nacional, os serviços públicos, a saúde, a educação, os transportes. Falámos de soluções para responder aos problemas, em alguns casos sinalizando divergências com medidas que o governo tomou e as preocupações que isso nos levanta - em relação às questões da banca, da contratação coletiva, com a perspetiva de adiamento desta discussão. E falámos de outras questões, de aspetos mais específicos, medidas do último orçamento que ainda estão por concretizar - o preço de gás de botija, a abertura dos museus ao domingo, a contratação de profissionais na área da saúde e educação. Foi uma reunião onde foi colocado um conjunto de questões muito alargado, algumas têm, obviamente, um enquadramento no orçamento mais óbvio, outras não precisam de ficar à espera do orçamento para poderem ser resolvidas.
Em relação às medidas que têm um enquadramento orçamental mais óbvio, que caderno de encargos é que o PCP apresentou ao governo?
O que sublinhámos foi a necessidade de termos uma discussão sobre o orçamento de forma profunda e fundamentada, com a profundidade e o rigor que o Orçamento do Estado exige.
Isso implica uma discussão até quando?
A perspetiva que tem sido avançada de que o orçamento devia ficar fechado em julho nunca nos foi colocada pelo governo. O orçamento não pode ficar fechado, de maneira nenhuma, a cinco meses da sua aprovação. Não nos parece que as eleições autárquicas devam condicionar o orçamento.
O PCP quer o IRS com dez escalões. O ministro das Finanças deve ter ficado assustado...
A discussão dos escalões já decorre há dois anos e já há mais tempo que defendemos os dez escalões. No próximo orçamento há condições para avançar em muita coisa em matéria de política fiscal, não só no IRS. O PCP não discute este ou aquele aspeto mais ou menos segmentado, fazemos uma consideração global. A questão da justiça fiscal não pode ter em conta só o IRS, tem que ter em conta o IRC, o IMI, o IVA. Há matérias como a derrama estadual em sede de IRC... Tem sido uma questão que o PCP tem discutido com o governo nos últimos dois anos, há condições para avançar no próximo orçamento. É um avanço. Porquê? Porque significaria maior receita fiscal para o Estado, tributando as empresas com mais de 35 milhões de lucros.
Mas isso foi falado na reunião de quarta? Há recetividade do governo?
Sim. É um elemento que registamos positivamente, a disponibilidade do governo para considerar esta proposta. Tal como em relação ao IRS e a um conjunto de matérias que têm ficado em aberto e em que há possibilidade de avançar. Os escalões, mas também as deduções, o mínimo de existência - que é uma matéria significativa -, a aplicação de taxas liberatórias em sede de IRS. Quem viva de dividendos de ações paga uma taxa liberatória de 28% independentemente de ter 10 mil ou 100 mil euros de rendimento anual. É uma injustiça para com os trabalhadores que são sujeitos a taxas de IRS diferenciadas. O fim das taxas liberatórias para os dividendos do capital seria um avanço do ponto de vista fiscal.
Tem alguma ideia do custo, em termos de receita fiscal, dos 10 escalões de IRS? O governo determinou um montante de 200 milhões de euros para a revisão dos escalões...
Só é possível fazer uma avaliação quando as propostas estão concretizadas na sua fórmula final. Mas ideia de condicionar a discussão da política fiscal a um espartilho de 200 milhões para esta medida, ou para a outra, ou 600 milhões em dois anos, é uma ideia de limitação na solução de um problema que existe. E o ponto de partida com que cada um inicia esta discussão não é pouco importante. Um exemplo: há um ano o PCP estava sozinho a exigir o aumento das pensões, o governo dizia que não havia margem, outros diziam que já havia aumento do complemento solidário para idosos, e o fim dos cortes, e que era aquilo que era possível... Nós continuámos a insistir e durante muito tempo batemo-nos sozinhos por isso. E a verdade é que quando chegámos ao final do orçamento havia efetivamente uma proposta de aumento das pensões aprovada.
O que é que o PCP pretende em relação ao mínimo de existência?
Estamos a falar do limite a partir do qual as pessoas não pagam IRS, que tinha uma fórmula de cálculo indexada ao salário mínimo nacional (SMN). O anterior governo alterou essa fórmula e transformou a indexação ao salário mínimo num valor absoluto. Com as subidas do SMN chega um momento em que os trabalhadores que recebem o salário mínimo passam a pagar impostos. Esta situação que o PSD e o CDS criaram não pode ser.
Mas defende a reindexação ao SMN?
As soluções podem ser variadas, pode ser uma indexação ao SMN, ao Indexante de Apoios Sociais, em função de um outro valor. A nossa preocupação é que não haja uma solução injusta para quem tem rendimentos muito baixos.
O que é que o PCP pretende para a área da educação e da saúde?
Há problemas muito diferenciados. Alguns já tiveram consideração nos últimos orçamentos, é preciso que a sua concretização se efetive durante o ano de 2017. Exemplos: contratação de médicos de família, de médicos para o interior, formação dos médicos internos que ficaram sem vagas de especialidade, contratação de enfermeiros de acordo com as necessidades dos serviços - este é um problema gravíssimo que tem implicações brutais do ponto de vista das condições de trabalho. São exemplos de coisas que estão no orçamento e que precisam de ser concretizadas. A mesma coisa em relação a questões da Educação. A falta de assistentes operacionais nas escolas é um problema dramático. Esperamos que o programa de combate à precariedade na Administração Pública dê resposta a uma parte destas situações, mas é preciso ir mais longe - está aprovada no orçamento a necessidade de revisão dos critérios do rácio aluno/assistente operacional. Por outro lado há problemas que são transversais, que têm que ver com o investimento - na saúde, na educação, nos transportes. A falta de investimento público em algumas das funções do Estado está a determinar prejuízos diretos às pessoas.
O PCP tem posto o acento na necessidade de alterar as leis laborais. Mas tem esbarrado muitas vezes na oposição do PS e do governo. Como é que se resolve este impasse?
A forma como se resolve este impasse tem que ser com mais luta dos trabalhadores. Isso é incontornável. Sem luta dos trabalhadores exigindo a resolução concreta deste - e de outros problemas laborais - não há governo nenhum que avance. Por outro lado, se o PCP em vez de 15 deputados tiver 86 também facilita... Há matérias em que é clara a divergência com o governo. E as matérias de legislação laboral são aquelas onde as divergências se têm tornado mais claras. A contratação coletiva é uma matéria central para os trabalhadores no seu dia-a-dia. Até agora não foi possível criar condições para que as alterações à legislação laboral, particularmente em matéria de contratação coletiva, pudessem avançar. Mas houve outras matérias em que houve avanço - o combate à precariedade. Nunca tinha sido possível aprovar na Assembleia da República medidas de combate à precariedade na Administração Pública. Nesta legislatura foi possível.
O prolongamento do subsídio para os desempregados de longa duração é para continuar?
Essa medida vem de 2016, continuou em 2017, teve um impacto significativo na vida de milhares de trabalhadores, a perspetiva é que se mantenha.
E o fim do corte de 10% no subsídio de desemprego?
É outra matéria em que temos vindo a insistir. Já foi discutida com alguma profundidade no orçamento para 2017. Vamos continuar a insistir. Há uma restrição de um direito que tem de ser invertida, é um dos cortes que tem de ser eliminado.
O PCP tem alguma nova proposta em termos de apoios sociais?
Há matérias que devem continuar a ser consideradas. Há um conjunto de apoio sociais onde tem havido avanços que, não correspondendo integralmente às propostas do PCP, contaram com o nosso contributo. O mês passado muitos milhares de crianças receberam uma bonificação no seu abono de família proposta pelo PCP. Ainda que a nossa perspetiva relativamente à reposição dos escalões do abono não tenha sido integralmente acolhida - é uma matéria na qual continuaremos a insistir. Tal como em relação à consagração plena da trajetória de aumento das pensões de reforma, que deve ser assegurada. Houve um primeiro aumento em janeiro deste ano, haverá um aumento extraordinário em agosto. É preciso consolidar essa perspetiva de aumento das pensões de reforma em 2018. Esperamos que se consolide essa trajetória, que resultou da insistência do PCP, quando muitos a davam por perdida.
Já negociou dois orçamentos, vai no terceiro. Nesta altura está no mesmo ponto em que estava nos outros anos ou o caminho está mais estreito?
Não sei se é uma questão de largura ou de estreiteza do caminho. É um problema de uma contradição que tende a acentuar-se. Quanto mais se procura avançar na resposta aos problemas, quanto mais se vai tornando clara a dimensão das expectativas que os portugueses têm na resolução dos problemas concretos das suas vidas, e ao mesmo tempo nos confrontamos com obstáculos à concretização dessas soluções, percebemos que há um caminho que vai tornando a contradição cada vez mais evidente. A questão não é a de isso conduzir a um beco sem saída porque não há becos sem saída em política. É uma questão de saber como é que essa contradição é superada. Se vencem os constrangimentos, naturalmente as expectativas transformam-se em insatisfação e descontentamento, em revolta com a falta de respostas.
E para onde é que pende a balança?
Nós fazemos por que ela penda para o lado da resolução dos problemas. Em relação a alguns aspetos não há dúvida de que o governo continua amarrado a constrangimentos que tornam essa contradição uma preocupação de facto. Quando vemos o governo amarrado aos constrangimentos do euro, do Tratado Orçamental, aos critérios que nos impõem as instituições europeias, isso deixa-nos a preocupação da contradição que se vai avolumando. A perspetiva que temos é que essa contradição deve ser superada resolvendo os problemas do povo português. Com a consciência de uma coisa: isso pode permitir saltos em frente enormíssimos. Por exemplo, os dados económicos que agora foram conhecidos, do primeiro trimestre. São dados positivos? São. Devem deixar-nos descansados? Não. Porque eles não resultam de alterações estruturais na economia, podem ser dados de mera conjuntura. Mas o que isto torna evidente é o valor das medidas que o PCP defende e propõe para o país, até do ponto de vista da recuperação económica. Não há dúvida de que estes dados de crescimento têm uma ligação muito próxima com as medidas de devolução de direitos e rendimentos.
Há pouco falou da luta dos trabalhadores, o líder do PCP já apelou à participação na jornada nacional de luta de 3 de junho, da CGTP. O PCP está com um pé no poder e outro na rua?
Estamos onde sempre estivemos, ao lado dos trabalhadores e do povo português. Seja na rua, seja na Assembleia.
Vai negociar um quarto orçamento de Estado nesta legislatura?
Isso não depende nem da minha vontade nem da minha opinião. O que temos vindo a dizer é que a correlação de forças que existe na Assembleia da República espelha a vontade de mudança que o povo português expressou nas últimas eleições. Julgo que este ano e meio que passou confirma integralmente o acerto da análise que o PCP fez logo na noite das eleições.
Essa leitura manter-se-á válida até ao fim da legislatura?
Da nossa perspetiva ainda há um caminho muito longo a fazer até que essa exigência de mudança esteja completamente correspondida. Há tantas e tantas medidas que é preciso ainda aprovar para corresponder a essa exigência que eu diria até que é pouco tempo aquele que há pela frente.
Haverá outra legislatura a seguir...
E por isso é que é preciso que uma nova correlação de forças na Assembleia da República seja ainda mais favorável aos trabalhadores e ao povo português, diria eu com mais força do PCP.
E veremos, em algum momento, os líderes do PS, do PCP e do BE juntos?
De quinze em quinze dias estamos todos juntos na Assembleia da República nos debates com o primeiro-ministro.

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